Terceirização no Brasil: Teremos paz?

Diante de tantas incertezas que o Brasil vive hoje, pergunto-me: será que teremos, algum dia, paz com o tema terceirização? Será que, após a aprovação do Projeto de Lei (PL) 4.330/2004, que no Senado é o Projeto de Lei da Câmara 30/2015, ou de qualquer outro texto legal que venha a ser aprovado pelo Congresso Nacional, teremos aumento ou decréscimo dos inúmeros processos trabalhistas em curso sobre a terceirização?

Embora tenhamos que reconhecer os avanços obtidos com o texto do PL 4.330, aprovado pela Câmara dos Deputados, no sentido de regularizar o tema, os novos pontos em aberto, tais como se apresentam para o início do debate no Senado, não nos parecem indicar que momentos pacificadores virão. Ademais, recentes notícias indicam que o Senado estuda apresentar novo projeto de lei. Independentemente dos novos passos legislativos, temos que trabalhar com o que há hoje para nos desvencilharmos da arapuca da fonte inesgotável de incertezas.

De acordo com recente debate realizado pelo jornal O Estado de S. Paulo, traduzido em matérias publicadas pelo jornal em 7/8/15, nenhuma das partes envolvidas está satisfeita, já que empresários não conseguiram a liberação ampla do processo e sindicalistas não evitaram uma abertura para a terceirização da atividade-fim. Se, por um lado, abriu-se a possibilidade de terceirizar a atividade-fim para empresas especializadas – e como contraponto, alterou-se a reponsabilidade da contratante para solidária –, do ponto de vista empresarial ainda permanece a dúvida sobre o que significa a terceirização ser a transferência feita pela contratante da execução de “parcela de” qualquer das suas atividades à contratada. Não há indicação no PL 4.330 de qual seria essa parcela (qual porcentagem?) e, assim, no vácuo legal, o Judiciário precisará definir tal expressão. Ou seja, haverá mais processos na esfera trabalhista, se assim permanecer sem uma definição legal.

No que tange aos processos de terceirização no setor financeiro, destaco o Artigo 8º do PL 4.330: “Quando o contrato de prestação de serviços especializados a terceiros se der entre empresas que pertençam à mesma categoria econômica, os empregados da contratada envolvidos no contrato serão representados pelo mesmo sindicato que representa os empregados da contratante, na forma do art. 511 da Consolidação das Leis do Trabalho CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.”

A atual dicotomia entre atividade-fim e atividade-meio traz intermináveis discussões sobre o enquadramento sindical do funcionário da contratada. Então, pelo menos que que diz respeito ao enquadramento sindical, o PL deve trazer segurança jurídica, definindo a extensão do referido Artigo 8º.

Importante destacar que representação sindical não se confunde com categoria sindical. Durante o processo legislativo na Câmara dos Deputados, o Artigo 8º sofreu adaptações, sendo que a sua redação contava com a frase final “observadas as respectivas convenções e acordos coletivos”. Ou seja, pode haver a representação sindical diferenciada, mas o respectivo enquadramento da categoria sindical dos empregados da contratada deve ser garantido e respeitado, até porque, conforme já bem explicado por especialistas, o cruzamento sindical é inviável na prática.

Outro ponto é o critério de classificação da atividade econômica, para fins de interpretação do Artigo 8º. Esse critério já existe na Classificação Nacional de Atividade Econômicas – CNAE, que é o instrumento de padronização nacional dos códigos de atividade econômica e dos critérios de enquadramento, aplicado a todos os agentes econômicos que estão engajados na produção de bens e serviços. Por exemplo, as atividades de serviços financeiros encontram-se na divisão 64, que compreende as atividades com a finalidade de criar, coletar, intermediar e redistribuir recursos financeiros próprios ou de terceiros sob sua responsabilidade.

Entendo que o CNAE é o critério o que deve ser adotado pela Justiça do Trabalho, para fins de definição de atividade econômica do Artigo 8º.

Por fim, e ainda sobre o enfoque da terceirização do setor financeiro, destaco o Artigo 20 do PL 4.330 sobre os correspondentes no País. Além de excluir as exigências de especialização e objeto único de modo a abarcar esse modelo no PL, o que demonstra sua importância para o Brasil, o PL 4.330 teve o benefício de trazer para uma lei a terminologia correta do modelo, abolindo por vez a expressão “correspondente bancário” (vale ressaltar que a expressão chegou a constar nas primeiras versões desse artigo, mas foi posteriormente corrigida pelo Deputado Arthur Oliveira Maia). Aliás, foi memorável a defesa pelo Deputado Arthur Maia, na leitura do projeto, do modelo dos correspondentes. Emocionou-me.

FINANCEIRO
Agosto / Setembro de 2015
Kátia Madeira Blaha
MKA Madeira Kliauga Advogados